sexta-feira, 31 de julho de 2020

Mar Português por Beth Lilás



Fernando Pessoa - MAR PORTUGUÊS

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!

Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.

Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.



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quinta-feira, 23 de julho de 2020

Esquadros - Adriana Calcanhoto | Sylvia Regina Marin


Eu ando pelo mundo
Prestando atenção em cores
Que não sei o nome
Cores de Almodóvar
Cores de Frida Kahlo, cores
Passeio pelo escuro
Com muita atenção no que minha irmã ouve
E como uma segunda pele um calo, uma casca
Uma cápsula protetora
A-ai, eu quero chegar antes
Pra sinalizar o estar de cada coisa
Filtrar seus graus
Eu ando pelo mundo divertindo gente
Chorando ao telefone
E vendo doer a fome
Nos meninos que têm fome
Pela janela do quarto pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
Eu ando pelo mundo
E os automóveis correm para quê?
As crianças correm para onde?
Transito entre dois lados
De um lado
Eu gosto de opostos
E exponho o meu modo, Me mostro
Eu canto para quem?




quinta-feira, 16 de julho de 2020

O Sono das Águas



O Sono das Águas
de
Guimarães Rosa
por
Beth Lilás



Há uma hora certa,
no meio da noite, uma hora morta,
em que a água dorme.

Todas as águas dormem:
no rio, na lagoa,
no açude, no brejão, nos olhos d’água,
nos grotões fundos
E quem ficar acordado,
na barranca, a noite inteira,
há de ouvir a cachoeira
parar a queda e o choro,
que a água foi dormir…

Águas claras, barrentas, sonolentas,
todas vão cochilar.
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas,
fios brancos, torrentes.
O orvalho sonha
nas placas da folhagem
e adormece.
Até a água fervida,
nos copos de cabeceira dos agonizantes…

Mas nem todas dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,
porque a água dos olhos
nunca tem sono…









quarta-feira, 8 de julho de 2020

Resposta ao Tempo - Aldir Blanc/Sylvia Regina Marin




A amiga Sylvia Regina tem um canal no YouTube. Acompanhe:  https://www.youtube.com/watch?v=1h5kVHO2Fx4

Batidas na porta da frente
É o tempo
Eu bebo um pouquinho pra ter
Argumento
Mas fico sem jeito, calado
Ele ri
Ele zomba do quanto eu chorei
Porque sabe passar
Num dia azul de verão sinto vento
Há folhas no meu coração é o tempo
Recordo um amor que eu perdi
Ele ri
Diz que somos iguais
Se eu notei
Pois não sabe ficar
E eu também não sei
E gira em volta de mim
Sussurra que apaga os caminhos
Que amores terminam no escuro
Sozinhos
Respondo que ele aprisiona
Eu liberto
Que ele adormece as paixões
E eu desperto
E o tempo se rói com inveja
De mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Pra tentar reviver
No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer

quarta-feira, 1 de julho de 2020

Recomeço ...

Olá, amigos!

Este Blog a partir de agora será o espaço para a Poesia Declamada, em vídeo ou em áudio.

Começo com um poema de
Antonio Cícero - Guardar -




Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso, melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que de um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo: